O Sofrimento no Trabalho e as Psicopatologias (Cezar Camargo)
Entende-se que o modo de adoecer de um
indivíduo provavelmente está diretamente ligado ao modo de viver deste dentro e
fora do ambiente de trabalho, sendo que este contém vários elementos que pode
ser a razão para o sofrimento. Segundo Dalgalarrondo (2008), a psicopatologia é
um campo de conhecimento que se refere ao adoecimento psíquico do ser humano, o
que se denomina historicamente doença ou transtorno mental. Para alguns
teóricos, o trabalho é o fundamento da vida humana e da sociedade. Engels
(1982) afirma que o trabalho criou o próprio homem e que o desenvolvimento
deste contribuiu significativamente para que o homem consolidasse seus laços
sociais. Sendo também o trabalho a base da teoria marxista, Marx (1968)
descreve que o homem passa a se diferenciar dos demais animais logo que passa a
produzir sua própria vida material, determinando, dessa forma, seus vínculos
sociais e políticos. Segundo Dejours (1992), o sofrimento no trabalho tem
origem na mecanização e robotização das tarefas, mas, principalmente nas
pressões e imposições da organização. Na visão dejouriana, o trabalho contém
vários elementos que influenciam a concepção que o trabalhador tem de sua
própria representação, que pode ser a razão para o sofrimento, e este, por sua
vez, é capaz de desestabilizar a identidade, conduzindo para problemas
psíquicos. Dentre as psicopatologias relacionadas ao trabalho destacam-se como
principais os Transtornos de Estresse, Síndrome de Burnout, Síndrome do Pânico,
entre outros. No campo laboral, o estresse é um dos principais desencadeadores
de sofrimento. Acredito que é
dever de todo empregador que pressa por seus colaboradores, estar atentos aos
sinais de estresse.
A Síndrome de Burnout caracteriza-se pelo
esgotamento físico e emocional, insatisfação pessoal, passando a pessoa a
apresentar comportamento agressivo e irritadiço (PEREIRA, 2002). O Transtorno
de Estresse Pós-Traumático e o Transtorno de Estresse Agudo vão se caracterizar
pela presença de um estressor externo, como a exposição ou vivência de episódio
traumático (FRANÇA, 1996). A Síndrome do Pânico, por sua vez, é um transtorno
de ansiedade e diferencia-se das demais condições mentais pelos ataques
inesperados e recorrentes, com crises acompanhadas de alguns sintomas
específicos como medo, desconforto no peito, despersonalização, sensação de
falta de ar, entre outros (SCARPATO, 2001). No caso dos trabalhadores do
sistema prisional, Silveira (2009) discute a convivência dos agentes
penitenciários com duas sociedades ao mesmo tempo, tendo em vista que a prisão
é “uma sociedade dentro de uma sociedade” (THOMPSON, 1991 apud SILVEIRA, 2009,
p. 05). Deste modo, ao entrar em
conflito ou choque social, esses trabalhadores passam por um processo de
socialização intra e extramuros, ocasionando, assim, um desgaste físico e
psicológico. É comum que esses profissionais apresentem alto grau de estresse e
seus reflexos negativos físicos e psíquicos entre outros problemas, em função
do dano psicológico e da mudança de convívio. Porém, Mendes (2002) enfatiza
que, apesar de estar associado a sensações de desconforto, o estresse pode ter
consequências negativas (ansiedade destrutiva, medo, tristeza e raiva) ou
positivas (equilíbrio, alegria, podendo haver momentos de ansiedade discreta,
criativa) para o indivíduo, por isso é importante que cada sujeito encontre seu
nível suportável de estresse, e isso requer acompanhamento continuo e profissional.
Com base na teoria Dejouriana (1992),
entende-se que o sofrimento patogênico do indivíduo surge quando a organização
do trabalho entra em conflito com os desejos do sujeito, ou seja, com o
funcionamento psíquico deste. Nesse
ponto temos a psicodinâmica do trabalho é uma abordagem científica,
desenvolvida na França na década de 1980 pelo psicanalista Christophe Dejours,
que investiga os mecanismos de defesa dos trabalhadores frente às situações
causadoras de sofrimento decorrentes da organização do trabalho. As questões da
vida pessoal não podem interferir no trabalho, bem como as questões do trabalho
não podem interferir na vida pessoal, para tanto é correto afirmar que o ser
humano é um todo indivisível. Segundo o manual de “Doenças Relacionadas ao
Trabalho”, do Ministério da Saúde (BRASIL, 2001), tratando-se dos transtornos
mentais e do comportamento relacionados a este, o trabalho é mediador de
integração social, tanto pelo seu valor econômico, quanto pelo seu valor
simbólico e cultural. O trabalho não é apenas uma atividade; ele é, também, uma
forma de relação social, o que significa que ele se desdobra em um mundo humano
caracterizado por relações de desigualdade, de poder e de dominação. Trabalhar
é engajar sua subjetividade num mundo hierarquizado, ordenado e coercitivo,
perpassado pela luta para a dominação (DEJOURS, 2008, p. 27). Dejours (1992)
discute um novo conceito de saúde e considera três elementos fundamentais para
a saúde do trabalhador. Sendo a fisiologia, ou seja, o funcionamento do corpo
(análise do funcionamento do organismo, as regras que asseguram seu equilíbrio
e sua sobrevivência), a psicossomática (relações que existem entre o que se
passa na cabeça das pessoas e o funcionamento de seus corpos) e por fim, a
psicopatologia do trabalho (adoecimento psíquico do ser humano, o que se
denomina historicamente doença ou transtorno mental). Sendo assim, a angústia
frente aos problemas transforma-se em fuga, fazendo com que o trabalhador se
distancie da coletividade social e siga em direção à decadência, como
alcoolismo, violência e, consequentemente, o desprezo das pessoas e a
depressão. Enfim, procuram saídas que podem levar ao risco de morte (DEJOURS,
1992). Para Dejours (1992), a insistência do ser humano em viver em um ambiente
adverso é uma das principais consequências do sofrimento no trabalho.
O Ministério da Saúde (BRASIL, 2001)
reconhece uma série de transtornos mentais e do comportamento relacionados ao
trabalho, como por exemplo, delírio, transtornos cognitivos, estresse
pós-traumático, neurose profissional, transtorno de vigília-sono, síndrome do
esgotamento profissional (burnout), síndrome do pânico e alcoolismo crônico.
Porém, estudos sobre psicopatologia do trabalho mostram que o sofrimento no
trabalho repercute não só na vida psíquica, ocorrendo assim uma desestruturação
na saúde em todos os seus aspectos, como a doença mental e a doença somática. Portanto,
o adoecimento dos profissionais depende da estrutura psíquica e mental do
sujeito e da capacidade deste para suportar as pressões do trabalho. Este
sofrimento é agravado pela insatisfação, medo e sentimento de incapacidade e
inutilidade.
Quando Freud escreve o livro
Psicopatologia da vida cotidiana seu principal interesse não é a análise das
estruturas psicopatológicas. Seu interesse é, antes, demonstrar como o
inconsciente se expressa no cotidiano. Sua intenção, ainda, é demonstrar que a
psicanálise não se limita ao estudo da anormalidade. O adoecimento no trabalho
deve ser avaliado no contexto em que acontece, bem como deve ser pensado no
sujeito que sofre, pois, o sofrimento psíquico é anônimo e suportado
individualmente.
Cezar Camargo
Consultor em T&D, Formando em Psicanálise
Clínica
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